difficil pelo audaz das figuras, pelo 
gigantesco das imagens, elle soube escapar aos defeitos e frioleiras do 
seiscentissimo que bebera na eschola, em composições nas quaes era 
mui facil introduzir-se o mau gosto; e ainda que Quita e Garção 
tentaram o mesmo genero, em nosso intender, Dinis não foi emulado. 
Capaz de todos os tons, no burlesco, no pastoril, no dithyrambico, nos 
deixou apreciaveis exemplos, e as suas dissertações sobre a poesia 
campestre são dictadas por um grande conhecimento da arte, ainda que 
não excedam em merecimento theorico as annotações de Gomes ás 
proprias poesias, nem os trabalhos de Freire e posteriormente de
Barbosa e Fonseca sobre as poeticas de Aristoteles e Horacio. 
Entretanto nenhum dos poetas e litteratos do seculo de José I olhou as 
letras de um ponto de vista eminente. Similhantes aos escriptores do 
seculo de Luiz XIV, foram muito eruditos, mas pouco philosophos, e 
assim o caracter das duas litteraturas é a confusão dos principios 
absolutos com os de convenção. Cingindo-se quasi cégamente á 
auctoridade dos antigos, miudeada e explanada pelos commentadores, a 
sua obediencia illimitada a alheias opiniões contribuiu muito para a 
posterior decadencia. A impertinente questão dos archaismos e 
neologismos veiu tomar o logar das discussões da Arcadia e essa 
occupação dos meios talentos e da meia instrucção, influindo sobre 
objectos mais importantes, viciou e acanhou toda a litteratura. Se as 
notas, que sobre palavras e phrases Francisco Manuel ajunctou ás suas 
poesias, fossem dedicadas a coisas, quão ricas messes nós colheriamos 
do saber d'este homem! Mas infelizmente não foi assim, e a polemica 
suscitada sobre o merito do immortal cantor dos Lusiadas, pelos 
insultos que contra elle vomitou o orgulhoso auctor do gelado Oriente, 
mostraram a que mesquinho estado tinha a critica chegado em Portugal. 
Parte dos reparos que Macedo copiou dos criticos franceses ficaram 
sem cabal resposta, porque os systemas estheticos mais liberaes e 
philosophicos que o dos antigos, e o da eschola de Boileau, eram em 
geral desconhecidos entre nós, e estamos persuadidos de que o juizo a 
respeito do tão grande quanto infeliz Camões ainda resta a fazer, apesar 
da abundancia de escriptos que sobre este objecto se publicaram. 
Emquanto assim entre nós a critica se apoucava, um sentimento vago 
de desgosto pelas antigas fórmas poeticas, a influencia da philosophia 
na litteratura, a necessidade que sentia o genio de beber as suas 
inspirações num mundo de idéas mais analogas ás dos nossos tempos, e 
emfim, varias outras causas difficeis de enumerar, começaram a crear 
na Europa uma poetica nova, ou, digamos antes, a fazer abandonar os 
canones classicos. A Alemanha foi o foco da fermentação, e foi lá que 
os principios revolucionarios em litteratura começaram a tomar desde a 
sua origem uma consistencia, e a alcançar uma totalidade de doutrinas 
methodicas e consequentes, não dada, ainda hoje, ao resto das nações. 
Lá não havia a luctar com a gloria nacional para a introducção de novas
idéas, porque os monumentos da eschola afrancesada de Opitz não 
honravam demasiadamente o dogmatismo intolerante do seculo de Luis 
XIV, impropriamente chamado classico, e Bodmer e Breitinger deram 
começo á revolução ousando preferir a poetica de Shakspeare e de 
Milton á de Racine e de Boileau; comtudo as opiniões na Alemanha 
teem-se desviado, em parte, d'esta direcção e as idéas de Schlegel já 
teem reagido na sua tendencia um tanto nova, sobre a litteratura inglesa 
donde tiveram origem. Na França o antigo systema, amparado pelo 
renome de muitas producções immortaes, disputa ainda a campanha ás 
innovações que entre esse povo, extremo em tudo, teem chegado a um 
deseafreamento barbaro e monstruoso. 
Mas a Portugal não coube o figurar nesta lide. A parte theorica da 
litteratura ha vinte annos que é entre nós quasi nulla: o movimento 
intellectual da Europa não passou a raia de um país onde todas as 
attenções, todos os cuidados estavam applicados ás miserias publicas e 
aos meios de as remover. Os poemas D. Branca e Camões appareceram 
um dia nas paginas da nossa historia litteraria sem precedentes que os 
annunciassem, um representando a poesia nacional, o romantico; outro 
a moderna poesia sentimental do Norte, ainda que descobrindo ás vezes 
o caracter meridional de seu auctor. Não é para este logar o exame dos 
meritos e demeritos destes dois poemas; mas o que devemos lembrar é 
que elles são para nós os primeiros e até agora os unicos monumentos 
de uma poesia mais liberal do que a de nossos maiores. 
Comtudo, não existindo ainda um só livro sobre as letras consideradas 
de um modo mais geral e mais philosophico do que os que possuimos; 
sem uma só voz se-ter levantado contra a auctoridade de Aristoleles e 
de seus infieis commentadores, será impossivel emittir um juizo 
imparcial sobre escriptos de similhante natureza. Julgá-los por fórmas 
que o poeta não admittiu, será um absurdo, emquanto se    
    
		
	
	
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