luminosa, apparece o Camões na terra de Portugal. 
O Camões é ao mesmo tempo a eloquente voz da posteridade, e a 
grandiosa resurreição dos tempos heroicos de Portugal. A sua 
penetrante visão intellectual descobre com a perfeição dos seus 
contornos immortaes as figuras, sobre que se concentra mais viva e
mais brilhante a purissima luz da vida nacional. A sua previdencia 
admiravel adivinha que veem perto os tempos calamitosos, em que a 
patria para morrer como Cesar com a grave e severa alteza dos heroes, 
precisará de cingir-se na purpura da sua antiga majestade, e compor-se 
e adereçar-se nas soberanas vestiduras da sua gloria. Virão épocas 
escassas, em que extranhos arrogantes hão de buscar descingir-lhe o 
gladio refulgente, desvestir-lhe a loriga impenetravel, e murchar-lhe na 
fronte os loiros immortaes. Tudo poderão emprehender. Mas o Camões, 
o soldado brioso das guerras africanas e indiaticas, o portuguez, que 
amou a patria acima da mulher, e a mulher acima da fortuna, o poeta 
que emulou nos antigos a belleza e a correcção, aos modernos superou 
no sentimento, ali está colligindo e ordenando nos versos varonis de 
uma epopéa nacional, as memorias da terra em que nasceu. 
Será na carta da Asia a India portugueza um ponto apenas, mas um 
ponto como estes que, em noites de serena atmosphera e de 
melancolica e tepida escuridade, estão brilhantemente scintillando, e 
esculpindo no ceo a distancias infinitas o seu vivo e eterno resplendor. 
Perdemos em grande parte a dominação e o imperio n'aquelles 
immensos territorios, onde outr'ora fluctuara, symbolo de empresas 
temerarias e felicissimas victorias, a bandeira de Portugal. Mas 
ninguem nos pôde nunca pleitear a gloria de as ter primeiro descoberto 
e avassallado. Que importa ao nome portuguez, que d'esse vasto e 
opulento senhorio não restem quasi já senão memorias? 
Cada povo tem na sequencia historica a sua funcção, no grande e vario 
drama da civilisação o seu papel. Uns em cada momento na evolução 
da humanidade são protagonistas e heroes, a outros cahem no 
complemento e execução da obra commum, officios mais modestos, 
mas não menos necessarias attribuições. É o principio harmonico e 
fecundo da divisão do trabalho applicado á cooperação mutua das 
nações, no empenho de fundir e aperfeiçoar a civilisação no decurso 
das edades. E d'este modo a noção da patria individual se esconde na 
penumbra da humanidade. 
A nossa missão não era a de grangear para nós o mundo, mas sim de o 
sujeitar e descobrir. Fomos com a espada os missionarios da velha
Europa, enviados a correr os primeiros lances, e affrontar os perigos, a 
que ninguem ousara então metter o peito resoluto. A gloria de descobrir 
é maior e mais duravel que a de fruir e dominar. A grandeza épica dos 
nossos feitos immortaes, mais se aprimora e abrilhanta n'esta 
abnegação e desapego, com que dos fructos das empresas 
sobrehumanas deixámos aos extranhos o proveito, para nós tomámos a 
gloria por salario. Dos grandes e magnificos descobrimentos, com que 
se accrescenta e se melhora a civilisação intellectual e a humana 
condição, não ficou enfeudada a propriedade exclusiva na geração e na 
familia dos gloriosos inventores. Kepler interrogando os ceos e os 
planetas, rebeldes e indomaveis até ali, clausurando-os no encerro 
perpetuo das suas orbitas ellipticas, vinculou o seu formoso 
descobrimento no morgado commum da humanidade. Os segredos, que 
o espirito de Newton soube roubar á mysteriosa natureza, doou-os 
generoso á sciencia cosmopolita e á civilisação universal. O telegrapho 
electrico transmitte o pensamento, sem que esteja agora recatado como 
cioso monopolio na familia ou na raça dos seus engenhosos 
descobridores. A locomotiva passeia sibilando pelo mundo, sem que 
antes do seu curso impetuoso esteja esperando a venia e o signal de 
quem primeiro a ideou e construiu. Assim tambem da terra que 
lustrámos nas suas mais afastadas e escondidas regiões. A gloria de a 
revelar á Europa cubiçosa, vale mais que a vaidosa satisfação de 
chamar nosso o que primeiro que ninguem soubemos procurar e 
descobrir. 
Das nossas aventurosas navegações e das nossas empresas bellicosas 
nasceu em grande parte o movimento operado na Europa desde o 
seculo XV. Tornámos possivel a sciencia moderna, que era truncada e 
imperfeita antes que ensinassemos as gentes européas a interrogar a 
natureza, e a descortinar as maravilhas e os segredos de inhospitas 
paragens, de mares desconhecidos, de um firmamento novo, onde 
brilham, escondidas aos antigos, novas e extranhas constellações. 
Revelámos a fórma do nosso globo, a configuração dos continentes, a 
continua successão do Oceano, a mudança e a condição dos varios 
climas. Patenteámos as riquezas innumeraveis da natureza organica, 
nos seus typos disseminados pela immensa vastidão das terras e dos 
mares. Atámos novamente os vinculos já rotos e perdidos entre a nossa
civilisação e a nossa historia, e a historia e as civilisacões dos povos 
orientaes. Com as nossas maravilhosas aventuras fizemos uma patria 
gloriosa e impozemol-a    
    
		
	
	
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