peitos.
Adorão os Heróes, e os mesmos brutos
Aos grilhões de 
Cupido estão sujeitos.
Quem, Marilia, despreza huma belleza, 
A luz da razão precisa,
E se tem discurso, pisa
A Lei, que lhe ditou 
a Natureza. 
Cupido entrou no Ceo. O grande Jove
Huma vez se mudou em chuva 
de ouro:
Outras vezes tomou as varias fórmas
De General de 
Thebas, velha, e touro,
O proprio Deos da Guerra deshumano 
Não viveo de amor illeso;
Quiz a Venus, e foi prezo
Na rede, que 
lhe armou o Deos Vulcano. 
Se amar huma belleza se desculpa
Em quem ao proprio Ceo, e terra 
move;
Qual he a minha gloria, pois igualo,
Ou excedo no amor ao 
mesmo Jove?
Amou o Pai dos Deoses Soberano 
Hum semblante peregrino:
Eu adoro o teu divino,
O teu divino 
rosto, e sou humano. 
LYRA IV. 
Marilia, teus olhos
São réos, e culpados,
Que soffra, e que beije
Os ferros pezados
De injusto Senhor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Mal vi o teu rosto,
O sangue gelou-se,
A lingoa prendeo-se,
Tremi, e mudou-se
Das faces a côr. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
A vista furtiva,
O risco imperfeito,
Fizerão a chaga,
Que abriste
no peito
Mais funda, e maior. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Dispuz-me a servir-te;
Levava o teu gado
Á fonte mais clara,
Á 
vargem, e prado
De relva melhor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Se vinha da herdade,
Trazia nos ninhos
As aves nascidas,
Abrindo 
os biquinhos
De fome ou temor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Se alguem te louvava
De gosto me enchia;
Mas sempre o ciume
No rosto accendia
Hum vivo calor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Se estavas alegre,
Dirceo se alegrava;
Se estavas sentida,
Dirceo 
suspirava
Á força da dor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Fallando com Laura,
Marilia dizia;
Surria-se aquella,
E eu 
conhecia
O erro de amor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Movida, Marilia,
De tanta ternura,
Nos braços me déste,
Da tua fé 
pura
Hum doce penhor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Tu mesma disseste
Que tudo podia
Mudar de figura;
Mas nunca 
seria
Teu peito traidor.
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Tu já te mudaste;
E a Olaia frondoza,
Aonde escreveste
A jura 
horrorosa,
Tem todo o vigor. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
Mas eu te desculpo,
Que o fado tyranno
Te obriga a deixar-me;
Pois busca o meu damno
Da sorte, que for. 
Marilia, escuta
Hum triste Pastor. 
LYRA V. 
A caso são estes
Os sitios formosos,
Aonde passava
Os annos 
gostosos?
São estes os prados,
Aonde brincava,
Em quanto 
pastava
O manso rebanho,
Que Alceo me deixou? 
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, 
tu chamas?
Espera que eu vou. 
Daquelle penhasco
Hum rio cahia,
Ao som do sussurro
Que vezes 
dormia!
Agora não cobrem
Espumas nevadas
As pedras 
quebradas:
Parece que o rio
O curso voltou. 
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, 
tu chamas?
Espera que eu vou. 
Meus versos alegre
Aqui repetia:
O Eco as palavras
Tres vezes 
dizia.
Se chamo por elle
Já não me responde;
Parece se esconde,
Cansado de dar-me
Os ais que lhe dou. 
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, 
tu chamas?
Espera que eu vou.
Aqui hum regato
Corria sereno,
Por marg[~e]s cobertas
De flores, e feno:
Á esquerda se erguia
Hum bosque fechado;
E o tempo apressado,
Que nada respeita,
Já 
tudo mudou. 
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, 
tu chamas?
Espera que eu vou. 
Mas como discorro?
Acaso podia
Já tudo mudar-se
No espaço de 
hum dia?
Existem as fontes,
E os freixos copados;
Dão flores os 
prados,
E corre a cascata,
Que nunca seccou. 
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, 
tu chamas?
Espera que eu vou. 
Minha alma, que tinha
Liberta a vontade,
Agora já sente
Amor, e 
saudade.
Os sitios formosos,
Que já me agradárão,
Ah! não se 
mudárão!
Mudárão-se os olhos,
De triste que estou. 
São estes os sitios?
São estes; mas eu
O mesmo não sou.
Marilia, 
tu chamas?
Espera que eu vou. 
LYRA VI. 
Oh! quanto póde em nós a varia Estrella!
Que diversos que são os 
genios nossos! 
Qual solta a branca vélla,
E affronta sobre o pinho os mares grossos.
Qual cinge com a malha o peito duro;
E marchando na frente das 
cohortes,
Faz a toare voar, cahir o muro. 
O sordido avarento em vão trabalha,
Que possa o filho entrar no seu 
Thesouro. 
Aqui fechado estende
Sobre a taboa, que verga, as barras de ouro.
Sacode o jogador da copo os dados;
E n'uma noite só, que ao somno 
rouba,
Perde o resto dos bens do pai herdados.
O que da voráz gulla o vicio adora
Da lauta meza os prazeres fia. 
E o terno Alceste chora
Ao som dos versos a que o genio o guia.
O 
sabio Gallileo toma o compasso,
E sem voar ao Ceo, calcula, e mede
Das Estrellas, e Sol o immenso espaço. 
Em quanto pois, Marilia, a varia gente,
Se deixa conduzir do proprio 
gosto; 
Passo as horas contente
Notando as graças do teu lindo rosto.
Sem 
cansar-me a saber se o Sol se móve,
Ou se a terra voltea, assim 
conheço.
Aonde chega a mão do grande Jove. 
Noto, gentil Marilia, os teus cabellos;
E noto as faces de Jasmins, e 
rosas: 
Noto os teus olhos bellos;
Os brancos dentes, e as feições mimosas.
Quem fez huma obra tão perfeita, e linda,
Minha bella Marilia, 
tambem póde
Fazer os Ceos, e mais, se ha mais ainda. 
LYRA VII. 
Vou retratar a Marilia,
A Marilia meus amores;
Porém como, se eu 
não vejo
Quem me empreste as finas cores!
Dar-mas a terra não 
póde;
Não que a sua côr mimosa
Vence o lyrio, vence a rosa:
O 
jasmim, e as    
    
		
	
	
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