astros inviolados, larangeiras!
Nunca mais me dareis seu riso ameno
E aquellas _lindas_, 
languidas olheiras. 
Quando é que, ó grande e santa Natureza!
Me poderás um dia 
consollar
--D'aquella que já mais eu pude amar!--
Inacreditavel, 
lugubre crueza! 
D'aquella que talvez, alegre e louca,
Eu de certo amaria;--amara, é 
certo!--
Mas que era pobre e só, e cuja boca
Tinha a vermelha côr 
d'um cravo aberto!
Cuja voz era doce como um favo,
Voz que tocava as cordas mais 
secretas!
Que nos fazia o coração escravo,
Cujos olhos... leaes 
tulipas pretas!... 
Nuvens d'Agosto, azul fundo e, sereno!
E astros inviolados, 
larangeiras!
Nunca mais me dareis seu riso ameno
E aquellas 
_lindas_, languidas olheiras! 
Nunca mais... Ah! mas não; Virá um dia,
--Dia livre de vis 
_conveniencias_!--
Que a ella me una em fim na terra fria,
E te 
ache ó paz! nas santas florescencias! 
*O PECCADO* 
Nunca cessamos de peccar
(Imitação de Christo) 
I 
*Ubique doemon* 
Bem sei... e mais que o sei, claro luar!
Que segundo a severa 
theologia,
Pelas noutes sonoras de poesia
O aroma dos lyrios faz 
peccar! 
Quem vos diría!... madresilvas, mar,
Lilazes, claros rios, cotovia!
Que ao dizer da tirannica theoria,
Vós farieis a Carne triumphar! 
Ah! Natureza, pois, se és criminosa,
E nos levam ao mal urnas da 
rosa,
Bom coração de Christo imaculado!... 
Quantos não vês morrer, do ceu prufundo,
Cheios de sangue, como 
heroes no mundo,
--Exhautos dos mil golpes do Peccado!?-- 
II 
*O Peccado*
Elle é antigo, tragico e venal,
Amando a Carne, o Crime e os 
assassinos,
E como a folha acerba d'um punhal,
--É quem golpeia 
os seios femeninos!-- 
É complicado, mystico, mortal,
Com sombrios escrupulos divinos,
E é quem faz estorcer os braços finos,
E escorregar a lagrima final. 
No entanto, grato e funebre Peccado!
Atrahente, gostoso e desejado,
Negro nome de vicio e perdição!... 
A Egreja vê em tudo as tuas chagas;
E ha muito tempo já que o 
mundo esmagas,
E te embriaga o sangue da Paixão! 
III 
*A Cidade* 
Em vão busco na velha e hostil Cidade,
Beata amante, de gangrenas 
cheia,
As dispersas raizes da Verdade,
--Como uma flor n'um pateo 
de cadeia. 
Quando, alta noute, D. _Juan_ passeia,
Ella põe-lhe em leilão a 
mocidade,
Tratada com a mystica anciedade
Com que um sabio 
cultiva a flor da Idea. 
Mas, comtudo ninguem receia tanto
O aspero Deus, e o lenho 
sacrosanto
Da dorida tragedia do Calvario! 
E, ó _D. Juan_, ás luzes das estrellas,
Tu bem sabes se encontras nas 
viellas
Mais de uma vez, perdido algum rosario!... 
IV 
*O Inimigo* 
Á genoux! Je suis Pan!
(Victor Hugo)
Ha muito que é chamado o Aborrecido,
O rebelde, o leproso, o 
descontente,
E eterno tentador sempre vencido,
Que habita o Ar, a 
Terra, e o Fogo ardente. 
Elle é a hydra, a Carne, o incontinente,
O orgulho nos abysmos 
submergido,
O que anda sempre em _nós_, o cão batido,
O espirito 
da Duvida, a Serpente, 
Mas, mau grado, ó Egreja, a tua ira,
Elle não é nem Vicio, nem 
Mentira,
Nem synonimo de Mal e de Impureza!... 
E eu bem sei, negro symbolo apupado,
Velho satyro, vil, calumniado,
Diabo! que te chamas «Natureza!» 
V 
*Em toda a parte* 
_Elles_ tem dito e escripto que o Peccado
Anda disperso e roe o 
mundo inteiro,
Que habita o duro coração guerreiro,
E o peito 
femenino e delicado. 
Que anda no ar, em nós, da flor no cheiro,
Das pugnas no ruido 
desolado,
No vinho, na paz doce do mosteiro,
--No corpo da mulher 
perfeito e amado!-- 
É portanto, homem timido e sujeito,
Quer te encostes, ou não, ao vão 
Direito,
O teu funebre gozo e teu tormento! 
Habitua-te a tel-o na Desgraça,
No ar, no chão, na flor, no som que 
passa,
--E até, serpente vil, no Pensamento! 
VI 
*Á Janella*
Altas horas da noute, quando a rua
É deserta da onda crapulosa,
No 
seu caminho em meio, vagarosa,
--Abro a minha janella a ver a lua. 
Como uma branca divindade nua
Ella avança celeste, e, á luz ditosa,
Qual copo de cristal que enche uma rosa,
O goivo do Peccado em 
luz fluctua. 
Fluctua, e é nestas horas recolhidas
Que me ergo então ás cupulas 
subidas
D'onde se avista o mystico ideal... 
E rio, e admiro o vulgo obsecado
Que cuida ver, nas beiras d'um 
telhado,
Abrir-se n'um _craveiro_ a flor do Mal! 
VII 
*Ella* 
Quando _ella_ emfim morrer, verão os vivos
Cortando o ar uns ais de 
sentimento,
Como os lugubres córos dos captivos
N'um triumpho, 
ou n'um grande saímento. 
Ouvir-se-hão soluços pelo vento,
Elogios, ais fundos, fugitivos,
Que dirão:--«Lá se vão meus lenitivos!
Morreu a Espada, a Lei, Guia 
e Sustento!» 
O seu tumulo terá goivos e rosas,
E vãs estatuas lividas, chorosas,
E 
epitaphios em lugubre latim. 
Terá palmas mais verdes que a Esperança;
--Mas a alma, em cima, 
escreverá:--Descança!
Serpente, irmã de Judas e Cain! 
*SONETO D'UM POETA MORTO* 
Achado nos seus papeis 
Bem sei que hei de morrer cedo e cansado,
Alguma cousa triste em
mim o diz,
E vagarei no mundo desterrado,
Como Dante chorando 
a Beatriz. 
Pelos reinos, irei talvez curvado,
Como um proscripto princepe 
infeliz,
Ou como o indio pallido e exilado
Chorando o vivo azul do 
seu payz. 
Mas no entanto, ah! ninguem ao Sol divino
Abrasou mais as azas, 
derretidas
Ante as duras, ferozes multidões! 
E ninguem teve a torre d'ouro fino,
Aonde, quaes princezas 
perseguidas,
Morreram minhas doudas illusões!    
    
		
	
	
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