a 
incorreção da asserção de que a copia fiel gozou da luz publica. 
No «Prologo ao Leitor» falla Miguel Lopes Ferreira do modo 
seguinte:--«Nesta historia se acham alguns pontos encontrados com a 
verdade, o que de nenhum modo se deve attribuir á malicia do Autor, 
senão a que naquelle tempo devia de ser esta a tradicção, que havia 
entre nós, mal fundada no principio, e peor continuada na boca dos que 
a passavão a outros, em que, como é natural, cada dia se vai 
desfigurando e perdendo sua fórma verdadeira. Estes descuidos 
emendou doutissimamente o Dr. Fr. Antonio Brandão, na 3.^a Parte da 
Monarchia Luzitana, porque examinou a verdade no segredo dos 
Cartorios em que estava sepultada. 
Algumas pessoas me aconselhavão que lhe fizesse notas, porém segui o 
parecer de outros, que assentárão, que como esta Chronica se imprimio 
para os que sabem, (Curiosa razão! Sómente os sabios devião lêr a 
Chronica; e não haveria ignorante que se quizesse instruir!) elles não 
ignorão pela lição de Fr. Antonio Brandão o que é tradição errada. Sahe 
pois a Chronica d'El-Rei D. Affonso Henriques da sorte que a escreveu 
Duarte Galvão.» 
Enganou-se Miguel Lopes Ferreira. Não foi tão brando em sua 
qualificação dos «pontos encontrados com a verdade,» o Censor Regio 
por cuja alçada teve a Chronica de passar, nem seguia elle systema de 
cura tão leniente e delicado. São suas palavras:
«Vi a Chronica d'El-Rei D. Affonso Henriques, que compoz Duarte 
Galvão, e que quer mandar imprimir Miguel Lopes Ferreira. De um 
louvo o zelo em fazer publicar as Chronicas dos nossos Reis, que tantos 
tempos ha que se conservão manuscriptas, e do outro não posso deixar 
de lhe não accusar a negligencia com que se houve na composição 
desta Chronica, porque parece que não fez exame algum para o que 
havia de escrever. Mas _como vejo riscado nella alguns capitulos_, e 
tudo vejo reformado pelo Dr. Fr. Antonio Brandão Chronista Mòr do 
Reino, no 3.^o Tomo da Monarchia Luzitana, bem se pode imprimir 
sem escrupulo»... 
A mutilação da Chronica foi portanto publicamente annunciada. 
Mas já não estava na mão de D. José Barbosa, ou de quem quer que foi 
que riscou esses capitulos, o privar a posteridade da gratificação de 
saber quaes esses effeitos da neglicencia e nenhum exame do Chronista, 
que El-Rei Dom Manoel encarregou de escrever a historia do Fundador 
da Monarchia Portugueza. 
Já em 1600 tinha Duarte Nunes de Leão impresso suas «Chronicas dos 
Reis de Portugal,» e na Vida e feitos de seu 1.^o Monarcha tinha elle 
dedicado um capitulo inteiro ao texto e á refutação das fabulas da 
Chronica velha[1] de D. Affonso Henriques. Este texto encerra toda a 
substancia dos Capitulos que hoje publicamos em sua fórma original. 
Havia ainda outro autor em cujas obras (ineditas em 1726) tinha sido 
incorporada a materia dos Capitulos riscados. Fallamos de Christovão 
Rodrigues Acenheiro, que escreveo em 1535 um Summario das 
Chronicas dos Reis de Portugal, cuja publicação devemos á Academia 
Real das Sciencias de Lisboa. (Ineditos da Historia Portugueza, Tomo 
5.^o--1824). Ahi encontramos esses impugnados feitos de D. Affonso 
Henriques, e encontramos de mais um juizo do Compilador sobre elles 
muito mais franco, muito mais claro, e muito menos mistico, do que 
aquelle que quiz idear Duarte Galvão. «Devem bem de notar os Reis e 
os Principes Christãos» diz Acenheiro, «estas façanhas do Cardeal e 
Bispo, e quanto devem pugnar pela honra de suas pessoas e Reino, 
quando com justiça e verdade o perseguem, como este Catholico Rei 
fazia e fez».
Não é comtudo do nosso intento entrarmos na discussão da veracidade 
da narração do nosso Chronista, que muito longe nos levaria, e em 
empreza nos metteria para a qual não temos forças. 
Numerosas são as duvidas que obscurecem a historia dos começos da 
Monarquia. A illigitimidade do nascimento da Snr.^a D. Thereza, mãi 
de D. Affonso Henriques--seu casamento com D. Fernando Peres de 
Trava, Conde de Trastamara, que a seu proprio irmão D. Vermuim 
Peres, (com quem já era casada) a usurpou,[2]--suas desavenças com 
seu filho e guerras que contra elle suscitou,--a jornada que por causa do 
exito de uma destas D. Egas Moniz emprehendeu a Castella;--a prisão a 
que D. Affonso Henriques condemnou sua mãi e desavenças que por 
este respeito teve com o Papa:--todos estes são pontos que tão 
tenazmente se tem affirmado, como fortemente combatido. 
Todavia a um e outro ponto já a bem instituida critica tem feito devida 
justiça; e a illigitimidade do nascimento e segundo casamento de D. 
Thereza (pelas doutas Dissertações de Antonio Pereira de Figueiredo, 
no Tomo 9.^o das Memorias da Academia Real das Sciencias de 
Lisboa--1825), assim como a jornada d'Egas Moniz (pela descripção de 
seu tumulo, como ainda hoje se vê em Paço de Souza, o que tambem 
devemos á mesma Academia) são pontos já reconhecidos como 
demonstrados.    
    
		
	
	
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