cortezão dos reis. É 
mister disfarçar mais, mentir sempre, e soffrer tudo. A popularidade 
vem com difficuldade e desvanece-se em um volver de olhos. Não vale 
o que custa. Nunca a procurei. N'estes livros, que são para o povo, 
escrevo o que me parece justo e util sem curar de lhe conquistar o 
affecto. Sei mesmo que terei occasiões de lhe desagradar. 
As minhas opiniões acerca da questão iberica são conhecidas em
Portugal e fóra do reino. Não são de hoje. A occasião de as manifestar 
mais extensamente é que veiu agora sem que eu a procurasse. 
Pareceu-me que a podia e devia aproveitar em beneficio publico, e 
assim o fiz, como qualquer outro portuguez o teria feito, escrevendo 
ácerca da fundação da monarchia. 
A idéa da união de Portugal com Hespanha é antiga, mas sempre 
nasceu de despeito ou de ambição quer dos homens de lá, quer dos de 
cá. Ora vão fundar o futuro dos povos sobre duas más paixões e verão 
que resultados alcançam! 
Os hespanhoes quando estão poderosos, querem arredondar o territorio, 
e quando andam mal governados, querem quem os governe bem. Em 
ambos os casos tem sempre olhado para Portugal com cobiça. Triste 
remedio para elles e para nós! 
Eu tenho muita affeição aos hespanhoes. É uma grande nação. 
Quero-os para visinhos, para irmãos, para amigos, para alliados, para 
confrades no trabalho da civilisação, para tudo emfim, menos para 
darem cabo do que tanto nos custou a estabelecer e firmar. 
Eu bem sei que se diz que nós ficaremos sendo os senhores, que a côrte 
ha de vir para Lisboa, e que até as armas portuguezas terão no escudo 
iberico o melhor logar antes das de Leão, de Castella e de Granada. 
Muito obrigado pela honra que nos fazem. Nós somos pequenos para 
tanto. 
A respeito da união de Portugal a Hespanha cada um diz o que lhe 
occorre á idéa; qual nos designa para sermos victimas de uma 
organisação geral de nacionalidades; qual nos imagina desejosos de 
pertencer á nação visinha; este pretende preparar-nos para a annexação 
pelo receio da possibilidade della; aquelle para utilidade propria 
avisa-nos do perigo que talvez inventou. 
Tudo isto póde ser verdade e tambem póde ser mentira. Acreditemos 
que é verdade; sejamos cada vez mais zelosos da nossa nacionalidade; 
procedamos de modo que a Europa nos julgue dignos de continuar a ser 
independentes, e não deixemos arreigar a idéa de que a fusão é
inevitavel. 
No fim de tudo, dos portuguezes a quem a idéa da união iberica 
agradou pela grandeza das consequencias que parecia resultarem d'ella, 
nenhum ha que na hora extrema seja capaz de renegar a patria. Nem 
dos hespanhoes sensatos haverá muitos que sonhem com a conquista e 
annexação do territorio portuguez contra nossa vontade. A questão é 
pois unicamente theorica. 
O resto da Europa pouco se importa das nossas cousas. Olha para o 
mappa, e resolve o negocio geographicamente. Em vez de dividir o 
territorio em dois estados iguaes, dando-nos a a metade occidental da 
peninsula, apaga a historia de sete seculos, e annexa-nos á Hespanha, já 
se sabe, para nosso bem. 
Contra este modo de sentencear devemos nós todos protestar por 
palavras e obras--verbo et opere.--Por palavras, indicando os dotes de 
nação forte e independente, que realmente possuimos; e por obras, 
dispondo-nos sem precipitação nem negligencia para sustentar o nosso 
bom direito. 
Possa este modesto livro contribuir para esse fim e ajudar a conservar 
vivas na lembrança do povo, as tradições da nossa gloria e das nossas 
virtudes antigas. 
Esse é o meu sincero desejo. 
 
A FUNDAÇÃO DA MONARCHIA PORTUGUEZA 
..............e venceram: Que pelo rei e patria combatendo Nunca foram 
vencidos portugueses GARRETT. Romanc. 
 
I 
INTRODUCÇÃO
A independencia de Portugal dura ha sete seculos. O braço leonez não 
pôde suffoca-la ao nascer, e os arabes tiveram que ceder os territorios 
do sul á energia dos cavalleiros e peões do conde D. Henrique, e ao 
esforço dos primeiros reis da dynastia affonsina. 
As fraquezas do formoso rei D. Fernando, os planos da rainha D. 
Leonor Telles, as ambições desleaes de alguns fidalgos e prelados, e as 
armas de D. João I de Castella não conseguiram sujeitar os portuguezes 
á dominação estrangeira. O povo não quiz ser castelhano. 
Bem lhe andaram a dizer que mais valia ser provincia de uma grande 
monarchia do que reino independente, mas pequeno e fraco. O povo 
quiz antes ficar pequeno em sua casa, do que ir ser grande na casa 
alheia. 
Com um mancebo por chefe combateu contra os castelhanos, conteve 
os naturaes que propendiam para o dominio estrangeiro, e depois de ter 
vencido as hostes inimigas, poz a corôa portugueza na cabeça do 
mestre de Aviz. 
Este principe era bastardo e clerigo. Que importava isso? A nação 
adoptou-o por seu filho legitimo; e elle proprio em Aljubarrota, 
escreveu com a    
    
		
	
	
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