Scenas Contemporaneas

Camilo Castelo Branco


Contemporaneas, by Camilo Castelo-Branco

Project Gutenberg's Scenas Contemporaneas, by Camilo Castelo-Branco This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.org
Title: Scenas Contemporaneas
Author: Camilo Castelo-Branco
Release Date: October 26, 2007 [EBook #23203]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK SCENAS CONTEMPORANEAS ***

Produced by Ricardo F. Diogo, Rita Farinha and the Online Distributed Proofreading Team at http://www.pgdp.net (This book was produced from scanned images of public domain material from the Google Print project.)

SCENAS CONTEMPORANEAS.

SCENAS CONTEMPORANEAS
POR
CAMILLO CASTELLO-BRANCO.
2.^a EDI??O.
PORTO: EM CASA DE CRUZ COUTINHO--EDITOR, Rua dos Caldeireiros n.^{os} 18 e 20. 1862.

Porto--TYPOGRAPHIA DE ANTONIO JOSé DA SILVA TEIXEIRA, Rua da Cancella Velha n.^o 62.

MORRER POR CAPRICHO.
I.
Os meus amigos, de certo, n?o sabem o que é ca?ar coelhos na neve?
N?o admira.
Imaginem-se em qualquer aldêa, nas visinhan?as do Mar?o. Olhem em redor de si, e contemplem o quadro que os viajantes na Suissa lhes descrevem todos os dias, supposto que nunca sahissem da sua terra.
A primeira impress?o que recebem é a do assombro. Leguas em roda, nem na terra nem no céo, se descobre uma crista de rochedo, a fran?a d'uma arvore, a dobra d'uma nuvem, que n?o seja branca, alvissima, desde um horisonte a outro horisonte.
E, depois, ha ahi em toda essa natureza amortalhada um silencio funebre. N?o cantam as aves, n?o balam os cordeiros, n?o silva o buzio de pegureiro, n?o soam nas quebradas as campainhas da arreata de machos.
Se ouvis um rugido assobiado ao qual respondem outros, n?o vos afasteis para longe da casa d'onde presenceaes, com o cora??o confrangido, esta scena. é uma alcatéa de lobos, que descem famintos da serra, e ser?o capazes de vos hirem buscar á cozinha, onde naturalmente tiritaes de frio, sentados ao pé do tóro de carvalho.
Fa?o-vos esta recommenda??o porque sois uns homens afeminados, que nunca sahistes dos sal?es, dos botequins, dos theatros, e das pra?as. Aposto que se desseis de face com um lobo, de garras arqueadas, e fauces inflammadas, antes que o lobo vos désse o cordial abra?o da fome, já vós tinheis perdida a sensibilidade, e consciencia da vida, e até o direito que todo o homem tem de matar n?o só o seu semelhante, mas até um lobo, em justa defeza!
Se eu podesse contar com o vosso animo, aconselhar-vos-hia, que em uma d'essas manh?s de neve, com meio covado de altura nos terrenos ch?os, tomasseis um cajado, e, com duas finas cadellas de coelho, fosseis dar na serra um passeio d'algumas horas.
O peor que podia succeder-vos era o desvio do caminho, que só com muita pratica se acerta, e, quando mal vos precatasseis, resvalar n'um abysmo de neve, onde nem as orelhas de fóra dissessem ao passageiro que um mo?o, a todos os respeitos excellente, f?ra alli absorvido por um sorvete dos que a natureza offerece aos amantes de refrescos, com menos economia que o Guichard.
Afóra este inconveniente, ainda ha o dos lobos, que muitas vezes tomam conta das nossas cadellas, devoram-nas com uma perfei??o e rapidez fabulosas, e, quando Deus quer, fazem dos nossos corpos um supplemento nutritivo ás nossas cadellas, deixando-nos a alma por muito grande obsequio.
O terceiro percal?o, affecto á ca?a do coelho na neve, aconteceu-me a mim, ultimo dos mortaes, em 26 de Dezembro de 1844.
é o que tereis a bondade de procurar saber no capitulo seguinte.
II.
Fui convidado por alguns amigos a acompanhal-os á serra, porque o sol refrangia-se em scintillas na neve, que parecia desfazer-se em laminas de prata.
Fui muito contente da considera??o que se me dava, como ca?ador, porque, em verdade vos digo, atirei com certeiro olho a perdizes e galinholas. Se nunca matei nenhuma, o que tambem é verdade, deve-se á pessima polvora das nossas fabricas. Em compensa??o, matei muito melro e tordo nas serdeiras, e consegui matar de noite uma coruja, africa que muitos ca?adores famosos de certo n?o fizeram. Eu fui um grande homem antes de escrever folhetins! Deus perd?e a quem me torceu a voca??o! Eu podia, a estas horas, ser um habil corredor de lebres, e assim tornei-me a lebre dos galgos sociaes.
Estes galgos sociaes, meu leitor, se tu és um d'elles, permitte-me dizer-te que tens o faro muito desca?ado, e que eu hei-de saltar por cima de ti, quando cuidares que me abocas. Se n?o és galgo, sensato amigo, aqui rasgo o diploma de tolo, que te concedi, sem te levar direitos de mercê.
Agora, vai entrar a historia direitinha até ao fim.
III.
Subimos á esplanada da serra. Eramos seis. Dividimo-nos em tres grupos, e combinamos em nos darmos signaes com tiros no caso de nos perdermos encobertos pelo nevoeiro, que poderia de improviso esconder-nos os cabe?os das serras, unicas balizas que nos serviam de guia.
Assim combinados,
Continue reading on your phone by scaning this QR Code

 / 65
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.