Os meus amores

Trinidade Coelho

Os meus amores

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Title: Os meus amores contos e balladas
Author: Trindade Coelho
Release Date: January 12, 2006 [EBook #17503]
Language: Portuguese
Character set encoding: ISO-8859-1
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Produced by Carla Martins Ramos and Ricardo Diogo. Edited by Rita Farinha (Biblioteca Nacional Digital--http://bnd.bn.pt). (This file was produced from images generously made available by National Library of Portugal (Biblioteca Nacional de Portugal).)

OS MEUS AMORES
TRINDADE COELHO
*OS MEUS AMORES*
(Contos e Balladas)
2.^a edi??o
LISBOA
Livraria de Antonio Maria Pereira
50, 52--Rua Augusta--52, 54
1894

LISBOA
Typographia e Stereotypia Moderna
11--Apostolos--11

Ao Doutor
Antonio Xavier Perestrello

?Os Meus Amores?
_Folhas dispersas dos meus annos de oiro, Vivo enxame das minhas alvoradas, Tenho zelos de vós, folhas sagradas, As Desdémonas sois de um outro moiro.
As brancas horas que eu em sonhos doiro, Essas horas febris, illuminadas, Eil-as fugindo, em tristes debandadas... Levaes nas azas todo o meu thesoiro.
Folhas: subi, voae ao céo t?o alto, Que o ceo em estrellas vos converta e mude, Lá nas longinquas illus?es que exalto;
Como as frementes aguas d'um a?ude, Levae a Deus, no derradeiro salto, O derradeiro adeus da juventude_...
Luiz Osorio.

IDYLLIO RUSTICO
A Fialho d'Almeida.
Quando atravessou a povoa??o, rua abaixo, com o rebanho atraz d'elle, era ainda muito cedo. Ao longo das ruas tortuosas, as portas conservavam-se fechadas, e n?o vinha das habita??es o mais insignificante ruido. Dormia-se a somno solto por todas aquellas casas. Apenas algum c?o, subitamente acordado em sobresalto pelo chocalhar do rebanho, ladrava do alto dos escadorios de pedra onde ficara de sentinella, ou de dentro das curraladas, onde levara a noite fazendo companhia aos novilhos. D'onde em onde, gallos madrugadores entoavam matinas sonoras, que eram como risadas vibrantes de bohemios, n'alguma esturdia, a deshoras...
Mas passadas as ultimas casas, o silencio condensava-se para toda a banda, n'uma grande pacifica??o de templo adormecido. Nem viv'alma pela ladeira que levava ao rio, por um caminho em zig-zags. Fulgiam no céo azul-escuro cardumes prateados de estrellas. A toda a largura, a paizagem era torva e indecisa, immersa n'uma luz muito morti?a que nem era bem a da madrugada, nem era bem a da noite. No emtanto a manh? era calma; nem rumores de briza pela rama das azinheiras velhas que faziam guarda ao corrego por onde o rebanho tomara. Cigarras, grillos nas hervagens, r?s que coaxavam nas regueiras, era o mais que se ouvia acima do rumor brando dos chocalhos. Nem um balido de ovelha em todo o rebanho que se ia submissamente á mercê do pequeno pastor, parando se elle parava a colher as amoras frescas dos silvados, recome?ando marcha se de novo elle se punha a caminhar.
Quando passou rente ao meloal da fidalga, ouviu-se o ruido de um tiro, que o echo levou para longe.
--N?o gastes polvora, Antonio!--recommendou o pastor.--Ouviste?
E logo a voz do guardador:
--Madrugas hoje, Gon?alo!
--P'ra que saibas: cá um homem n?o tem medo.
--Está bem. Adeus!
--Saudinha.
A esse tempo ia-se já definindo a manh?, na luz, no som, na c?r. Invadia a amplid?o da cupula celeste uma tinta alvacenta, onde as estrellas feneciam no seu brilho. Ao alto, na ladeira d'além, entravam de fazer-se nitidas as linhas sinuosas das cristas, onde enormes rochedos tinham altitudes de uma immobilidade mysteriosa e sinistra... N'este assomo d'alvorada, as coisas iam despertando lentamente para a alacridade vigorosa da luz. Das moitas e sebes, calhandras era bandos levantavam-se repentinamente, em v?o perpendicular, e cortavam ares fóra, chilreantes e alegres, até se perderem de vista por de traz dos arvoredos e cabe?os. De cauda em riste e orelhas immoveis, o rafeiro espreitava as hervagens seccas, onde algum reptil passasse vagaroso.
--Busca, Turco!--fazia-lhe o Gon?alo que tinha medo ás cobras.--Busca, valente!
á medida que descia a ladeira, um marulhar monotono de aguas ouvia-se, mais e mais distincto. Era o rio que parecia perto; mas primeiro que lá se chegasse ainda era preciso andar... Era um poder de passos e de paciencia,--reflectia o pastor, a quem aborreciam de morte os interminaveis torcicollos da vereda. Ia andando, descendo sempre, á frente do rebanho silencioso. E quando os sapatos come?aram de calcar areia, e ali, perto, o rio lampejava, sob aquelle céo ainda estrellado, o Gon?alo desabafou:
--Uff! até que emfim!--E pensava aliviado:--Nada mais facil do que terem-me sahido os lobos!...
Mas vista áquella hora, e no meio de tal silencio, a corrente liquida tinha o que quer que fosse de sinistro, que evocava lembran?as aterradoras, espectros dos que ali mesmo tinham morrido afogados, n'uma lucta desesperada com as aguas, clamando em v?o que lhes acudissem, em tamanho transe afflictivo. A margem de lá, especialmente, era toda accidentada de rochedos informes, blocos medonhos, por entre os quaes no
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