Os fidalgos da Casa Mourisca, by 
Júlio Dinis 
 
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Title: Os fidalgos da Casa Mourisca Chronica da aldeia 
Author: Júlio Dinis 
Release Date: August 4, 2005 [EBook #16428] 
Language: Portuguese 
Character set encoding: ISO-8859-1 
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FIDALGOS DA CASA MOURISCA *** 
 
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OS FIDALGOS DA CASA MOURISCA
OS FIDALGOS 
DA 
CASA MOURISCA 
CHRONICA DA ALDEIA 
POR 
*JULIO DINIZ* 
*VOLUME I* 
*PORTO* 
TYPOGRAPHIA DO JORNAL DO PORTO Rua Ferreira Borges, 31 
1871 
 
OS FIDALGOS DA CASA MOURISCA 
 
I 
A tradição popular em Portugal, nos assumptos de historia patria, não 
se remonta além do periodo da dominação arabe nas Hespanhas. 
Pouco ou nada sabe o povo de celtiberos, de romanos e de wisigodos. É, 
porém, entre elle noção corrente que, em outros tempos, fôra este paiz 
habitado por mouros, e que só á força de cutiladas e de botes de lança 
os expulsaram os christãos para as terras da Mourama. Os vultos 
heroicos de reis e cavalleiros nossos, que se assignalaram nas luctas 
d'essa época, ainda não desappareceram das chronicas oraes, onde 
vivem illuminados por a mesma poetica luz das xacaras e dos romances 
nacionaes; e hoje ainda, nas dansas e jogos que se celebram nos logares 
publicos das villas e aldeias, por occasião das principaes solemnidades
do anno, apraz-se a memoria do povo de recordar os feitos d'aquelles 
tempos historicos por meio de simulados combates de mouros e 
christãos. 
Nos contos narrados em volta da lareira, onde nas longas noites de 
serão se reune a familia rustica, ou ás rapidas horas d'uma noite de estio, 
na soleira da porta, ao auditorio attento que segue com os olhos a lua 
em silenciosa carreira por um céo sem estrellas, avulta uma creação 
extremamente sympathica, a das mouras encantadas, princezas 
formosissimas que ficaram d'esses remotos tempos na peninsula, em 
paços invisiveis, á espera de quem lhes venha quebrar o captiveiro, 
soltando a palavra magica. 
Falla-se em diversos pontos das nossas provincias, com a seriedade que 
é propria a uma arreigada crença, de thesouros enterrados, que os 
mouros por ahi deixaram, na esperança de voltarem um dia a 
resgatal-os, e já não tem sido poucas as escavações emprehendidas no 
ávido intuito de os descobrir. 
Esta mesma noção historica do povo é a que dá logar a um outro 
frequente facto. Quando, no centro de qualquer aldeia, se eleva um 
palacio, um solar de familia, distincto dos edificios communs por uma 
qualquer particularidade architectonica mais saliente, ouvireis no sitio 
designal-o por o nome de Casa Mourisca, e, se não se guarda ahi 
memoria da sua fundação, a chronica lhe assignará infallivelmente 
como data a lendaria e mysteriosa época dos mouros. 
Era o que succedia com o solar dos senhores Negrões de Villar de 
Corvos, que, em tres leguas em redondo, eram por isso conhecidos pelo 
nome dos Fidalgos da Casa Mourisca. 
Não se persuada o leitor de que possuia aquelle solar feição 
pronunciadamente arabe, que justificasse a denominação popular, ou 
que mãos agarenas houvessem de feito cimentado os alicerces da casa 
nobre denominada assim. Ás pequenas torres quadradas, que se 
erguiam, coroadas de ameias, nos quatro angulos do edificio, ao 
desenho ogival das portas e janellas, ás estreitas setteiras abertas nos 
muros, e finalmente a certo ar de castello feudal, que um dos
antepassados d'esta fidalga familia tentou dar aos paços de sua 
residencia senhoril, devêra ella a qualificação de mourisca, que 
persistira, apesar dos protestos da arte. Nenhum estylo architectonico 
fôra na construcção escrupulosamente respeitado; o gosto e capricho do 
proprietario presidiram mais que tudo á traça e execução da obra; não 
ha pois exigencias artisticas que me imponham a obrigação de 
descrevel-a miudamente. 
Diga-se porém a verdade; fossem quaes fossem os defeitos de 
architectura, as incongruencias e absurdos d'aquella fabrica grandiosa, 
quem, ao dobrar a ultima curva da estrada irregular por onde se vinha á 
aldeia, via surgir de repente do seio de um arvoredo secular aquelle 
vulto escuro e sombrio, contrastando com os brancos e risonhos casaes 
disseminados por entre a verdura das collinas proximas, mal podia reter 
uma exclamação de surpreza e involuntariamente parava a 
contemplal-o. 
Ou o sol no poente lhe doirasse a fachada de granito, ou as ameias, que 
o coroavam, se desenhassem como negra dentadura no céo azul, 
alumiado pela claridade matinal, era sempre melancolico e triste o 
aspecto d'aquella residencia, sempre magestoso e severo. 
Reparando mais attentamente, outros motivos    
    
		
	
	
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