Elegias | Page 2

Teixeira de Pascoais
pousou,?Relampago do Além,?Sobre ti, meu querido e pobre Anjinho,?Já deitado na cama e t?o doentinho,?Cercado da afflic??o de tua M?e;?Esse olhar fez-se eterno,?Em meus olhos ficou: é luz do inferno?Que tudo me alumia...
Parece a luz do dia!
NO SEU TUMULO
Sobre o seu frio ber?o sepulcral,?Meu espirito resa ajoelhado;?E sente-se perfeito e virginal?Na sua d?r divina concentrado.
Caí, gotas de orvalho matinal!?Astros, caí do céu todo estrelado!?Sêcas fl?res do zéfiro outomnal,?Vinde enfeitar-lhe o tumulo sagrado!
ó luar da meia noite, encantamento?De sombra, vem cobri-lo! ó doido Vento,?Dorme com ele, em paz religiosa...
Sobre ele, ó terra, sê brandura apenas;?Faze-te luz, toma o calor das pennas;?Sê M?e perfeita, b?a e carinhosa.
DELIRIO
N?o posso crêr na morte do Menino!?E julgo ouvi-lo e vê-lo, a cada passo...?é ele? N?o. Sou eu que desatino;?é a minha d?r soffrida, o meu cansa?o.
Delirio que me prendes num abra?o,?Emendarás a obra do Destino??Vê-lo-ei sorrir, de novo, no rega?o?Da m?e? Verei seu rosto pequenino?
Misterio! Sombra imensa! Alto segredo!?Jamais! jamais! Quem sabe? Tenho mêdo!?Que vejo em mim? A treva? a luz futura?
Ah, que a d?r infinita de o perder?Seja a alegria de o tornar a ver,?Meu Deus, embora noutra creatura!
REMORSOS
Onde comtigo, um dia, me zanguei,?é hoje um sitio escuro que aborre?o;?E sempre que ali passo, eu anoite?o!...?Ah, foi um crime, sim, que pratiquei!
Quantas negras torturas eu pade?o?Pelo pequeno mal que te causei!?Se, ao menos, presentisse o que hoje sei??Mas n?o; fui mau; fui bruto; reconhe?o!
E s?ffro mais, por isso, a tua morte,?E dou mais ch?ro amargo ao vento norte,?Mais trevas se acumulam no meu r?sto...
ó vós que n'este mundo amaes alguem,?Seja linda crean?a ou pae ou m?e,?N?o lhe causeis nem sombra de desg?sto!
NO CREPUSCULO
Nasce a luz do luar dos derradeiros,?êrmos, soturnos pincaros sósinhos...?Andam sombras no ar e murmurinhos?E vagidos de luz... e os Pegureiros?Descem, cantando, a encosta dos outeiros...
Tangendo amenas frautas amorosas,?Seus vultos, no crepusculo, desmaiam?E assim como os seus canticos, se espraiam?Em ondas de emo??o. As fragarosas?Quebradas que o luar beija, misteriosas?Furnas, boccas de terra, murmurantes,?Arvoredos extaticos orando,?Rochedos, na penumbra, meditando,?Desfeitos em ternura, esvoa?antes,?Pairam tambem no espa?o comovido,?Das primeiras estrelas já ferido,?Todo em luar e sombra amortalhado...
E eu choro sobre um monte abandonado...
E o Phantasma divino da Crean?a,?Sombra de Anjinho em flor,?Nos longes dos meus olhos aparece,?Como se, por ventura, ele nascesse?Da minha incerta e trémula esperan?a,?E n?o da minha firme e eterna d?r!
E choro; e alem das lagrimas, eu vejo?Aquele d?ce Vulto pequenino,?Em seu leito de morte e soffrimento;?Jesus martirisado, inda Menino...?E é como cinza morte o meu desejo?E como extinta luz meu pensamento!
Depois, a sua Imagem soffred?ra?Regressa á Vida, veste-se de aurora;?Os seus labios sorriem para mim...?E aquelles verdes olhos cristalinos?Abrem-se radiosos e divinos,?E vejo-o ent?o brincar no meu jardim!
Vejo-o como ele foi, como ele existe?No cora??o da M?e por toda a vida!?Anjinho tutelar da nossa casa!?A divina Esperan?a florescida,?Brilhando além de tudo quanto é triste...?Longinquo Alivio, protectora Asa!
Mas de que serve? Eu choro sem descan?o,?No meio da tristêsa indiferente?Das Cousas que têm a alma sempre ausente...
Só eu na minha d?r nunca me can?o.
ó brutêsa das Cousas! No infinito?E gélido silencio, eu ou?o um grito!?Na funda solid?o que me rodeia,?Um sêr apenas, tétrico, vagueia...
Quem grita? O meu espirito. E que importa??é ele a errar no mundo solitario,?Sem principio nem fim, sem pae nem m?e!
ó céu indiferente! ó terra morta!?ó grito de Jesus sobre o Calvario,?A subir no Infinito, cada vez?Mais cercado de tragica mudez,?Mas afflicto, mais alto, mais além!...
Cousas que já fizestes companhia?A este espirito meu que, em vós, se via,?Porque me abandonastes? êrmo Vento,?Insonia do ar correndo o Firmamento,?Só vejo, em ti, loucura inanimada,?Revolta inconsciencia destruidora!
Alta estrela, na noite, incendiada,?Passarinhos do céu, cantos da aurora,?Já n?o palpita em vós meu cora??o...?Sois o silencio, a treva, a solid?o.
Além de mim já nada avisto. As cousas,?Arvores, nuvens, serras pedregosas,?S?o penumbras que á luz do meu olhar?Se dissipam, de subito, no ar.
De tal forma meu sêr se concentrou?Na vis?o da Crean?a, que além d'ela,?N?o vejo fl?r ou ave ou luz de estrela,?Limpido céu azul, verde paisagem!?Dir-se-á que o seu Espectro reencarnou?Em mim,--que n?o sou mais que a sua Imagem!
SOBRESALTO
Quantas horas passava contemplando?Seu pequenino Vulto. Era um Anjinho?Dentro de nossa casa, aben?oando...?Era uma Fl?r, um Astro, um Amorzinho.
Um dia, em que ele, ao pé de mim, sósinho?Brincava, estes meus olhos inundando?De gra?a, de inocencia e de carinho,?De tudo o que é celeste, alegre e brando,
Vi tremer sua Imagem, de repente,?No ar, como se f?ra Apari??o.?E para mim eu disse tristemente:
"Pertences a outro mundo, a um céu mais alto;?Partirás dentro em breve." E desde ent?o?Eu fiquei num constante sobresalto!
ENCANTAMENTO
Quantas vezes, ficava a olhar, a olhar?A tua d?ce e angelica Figura,?Esquecido, embebido num luar,?Num enlêvo perfeito e gra?a pura!
E á for?a de sorrir, de me encantar,?Deante de ti, mimosa Creatura,?Suavemente sentia-me apagar...?E eu era sombra apenas e ternura.
Que inocencia! que aurora! que alegria!?Tua figura de Anjo radiava!?Sob os teus pés a terra florescia,
E até meu proprio espirito
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