Contos para a infância, by 
Guerra Junqueiro 
 
The Project Gutenberg EBook of Contos para a infância, by Guerra 
Junqueiro This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and 
with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away 
or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included 
with this eBook or online at www.gutenberg.net 
Title: Contos para a infância Escohidos dos melhores auctores 
Author: Guerra Junqueiro 
Release Date: August 4, 2005 [EBook #16429] 
Language: Portuguese 
Character set encoding: ISO-8859-1 
*** START OF THIS PROJECT GUTENBERG EBOOK CONTOS 
PARA A INFÂNCIA *** 
 
Produced by Biblioteca Nacional Digital (http://bnd.bn.pt), Rita 
Farinha and the Online Distributed Proofreading Team at 
http://www.pgdp.net 
 
CONTOS PARA A INFANCIA 
ESCOLHIDOS DOS MELHORES AUCTORES POR GUERRA
JUNQUEIRO 
LISBOA 
TYPOGRAPHIA UNIVERSAL DE THOMAZ QUINTINO 
ANTUNES, IMPRESSOR DA CASA REAL 
Rua dos Calafates, 110 
1877 
 
*A mãe* 
Estava uma mãe muito afflicta, sentada ao pé do berço do seu filho, 
com medo que lhe morresse. A creancinha pallida tinha os olhos 
fechados. Respírava com difficuldade, e ás vezes tão profundamente, 
que parecia gemer; mas a mãe causava ainda mais lastima do que o 
pequenino moribundo. 
N'isto bateram á porta, e entrou um pobre homem muito velho, 
embuçado n'uma manta d'arrieiro. Era no inverno. Lá fóra estava tudo 
coberto de neve e de gêlo, e o vento cortava como uma navalha. 
O pobre homem tremia de frio; a creança adormecêra por alguns 
instantes, e a mãe levantou-se a pôr ao lume uma caneca com cerveja. 
O velho começou a embalar a creança, e a mãe, pegando n'uma cadeira, 
sentou-se ao lado d'elle. E contemplando o seu filhinho doente, que 
respirava cada vez com mais difficuldade, pegou-lhe na mãosinha 
descarnada e disse para o velho: 
--Oh! Nosso Senhor não m'o hade levar! não é verdade?-- 
E o velho, que era a Morte, meneou a cabeça d'uma maneira extranha, 
em ar de duvida. A mãe deixou pender a fronte para o chão, e as 
lagrimas corriam-lhe em fio pela cara. Sentiu-se estonteada com um 
grande peso de cabeça; estava sem dormir havia tres dias e tres noites. 
Passou ligeiramente pelo somno, durante um minuto, e despertou
sobresaltada a tremer de frio. 
--Que é isto! exclamou, lançando á volta de si o olhar hallucinado. O 
berço estava vasio. O velho tinha-se ido embora, roubando-lhe a 
creança. 
* * * * * 
A pobre mãe saiu precipitadamente, gritando pelo filho. Encontrou uma 
mulher sentada no meio da neve, vestida de luto. «A Morte entrou-te 
em casa, disse-lhe ella. Via sair a correr levando teu filho. Anda mais 
depressa que o vento, e o que ella furta nunca o torna a entregar.» 
--Por onde foi ella? gritou a mãe. Dize-m'o pelo amor de Deus!» 
--Sei o caminho por onde ella foi, respondeu a mulher vestida de preto. 
Mas só t'o ensino, se me cantares primeiro todas as canções que 
cantavas ao teu filho. São lindas, e tens uma voz harmoniosa. Eu sou a 
Noite e muitas vezes t'as ouvi cantar, debulhada em lagrimas. 
--Cantar-t'as-hei todas, todas, mas logo, disse a mãe. Agora não me 
demores, porque quero encontrar o meu filho.-- 
A Noite ficou silenciosa. A mãe então, desfeita em lagrimas, começou 
a cantar. Cantou muitas canções, mas as lagrimas foram mais do que as 
palavras. 
No fim disse-lhe a Noite: «Toma á direita, pela floresta escura de 
pinheiros. Foi por ahi que a Morte fugiu com o teu filho.» 
A mãe correu para a floresta; mas no meio dividia-se o caminho, e não 
sabia que direcção havia de seguir. Diante d'ella havia um mattagal, 
cheio de silvas, sem folhas nem flores, de cujos ramos pendia a neve 
cristallisada. 
* * * * * 
--Não viste a Morte que levava o meu filho?» perguntou-lhe a mãe.
--Vi, respondeu o mattagal, mas não te ensino o caminho, senão com a 
condição de me aqueceres no teu seio, porque estou gelado.» 
E a mãe estreitou o mattagal contra o coração; os espinhos 
dilaceraram-lhe o peito, d'onde corria sangue. Mas o mattagal vestiu-se 
de folhas frescas e verdejantes, e cobriu-se de flores n'uma noite 
d'inverno frigidissima, tal é o calor febricitante do seio d'uma mãe 
angustiosa. 
E o mattagal ensinou-lhe o caminho que devia seguir. Foi andando, 
andando, até que chegou á margem d'um grande lago, onde não havia 
nem barcos, nem navios. Não estava sufficientemente gelado para se 
andar por elle, e era demasiadamente profundo para o passar a váo. 
Comtudo, querendo encontrar o seu filho, era necessario atravessal-o. 
No delirio do seu amor, atirou-se de bruços a ver se poderia beber toda 
a agua do lago. Era impossivel, mas lembrava-se que Deus, por 
compaixão, faria talvez um milagre. 
--Não! não és capaz de me esgotar, disse o lago. Socega, e 
entendamo-nos amigavelmente. Gosto de vêr perolas no fundo    
    
		
	
	
	Continue reading on your phone by scaning this QR Code
 
	 	
	
	
	    Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the 
Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.
	    
	    
