seria; 
porque quando elle nas côrtes que então foram, se escusava aceitar 
outra vez o regimento para que o forçava, bem via que lhe dera Deus tal 
siso e tal disposição, que per si sem outra ajuda poderia reger estes seus 
reinos e outros maiores; porém pois assi era sua vontade, que lhe pedia 
por mercê que com o regimento juntamente quizesse tambem tomar sua 
mulher, pois era em edade para isso; porque assim faria mais por sua 
honra e estado. No que El-Rei então consentiu; e ficou logo entre elles
tempo assignado para isso, no qual o Infante se percebeu dos 
corregimentos e cousas que para a pessoa d'El-Rei e da Rainha, e assi 
para sua casa e camara cumpria; mas El-Rei por induzimentos d'alguns, 
e do Arcebispo de Lisboa principalmente, que de noite lhe ia falar, não 
esteve pela concordia em que ficara; porque antecipou o tempo, e 
tornou requerer o Infante, que logo leixasse o regimento; porque antes 
de casar elle inteiramente queria reger, cá em outra maneira não seria 
sua honra nem convinha a seu estado, ao que o Infante por não dar 
causa a mais danamento, logo satisfez e desistiu em todo do mandado e 
governança que tinha, em tanto que as cartas e provisões que d'antes 
foram por elle desembargadas, e eram feitas para se de seu nome 
assignarem, não as quiz mais assignar, nem entender em cousa que a 
regimento pertencesse. 
E porém El-Rei no mez de Maio de mil e quatrocentos e quarenta e sete, 
em Santarem, tomou sua casa e sua mulher juntamente, com as benções 
e cerimonias pela Santa Igreja em taes casos ordenadas, e com alguma 
mostrança de festas, mas não foram n'aquella perfeição e cumprimento 
que o Infante quizera e tinha ordenado. Porque como leixou o 
regimento, logo todalas cousas ainda que fosse sem culpa sua, para seu 
desfavor lhe volveram as costas. 
 
CAPITULO LXXXIX 
Das cousas que o conde de Barcellos fez em abatimento do Infante D. 
Pedro depois que soube que já não regia, e para lançarem o Infante 
fóra da côrte 
O duque de Bragança como soube que o Infante desistira do regimento, 
e que já El-Rei absolutamente regia, por imprimir e confirmar no povo 
a suspeita de desleal que contra o Infante tinha já com El-Rei 
principiada, partiu da Villa de Chaves, e com estrondo de gente armada 
se foi á cidade do Porto, e a Guimarães e Ponte de Lima, e a outros 
logares d'aquella comarca, onde aos criados do Infante tirou os officios 
que tinham d'El-Rei, e a todos com infamia de tredores lançou fóra, e 
com nome de receio do Infante mandou velar e roldar as villas e
castellos, como se El-Rei e o Infante foram imigos e houvera já entre 
elles pregoada guerra, com outras oniões d'esta calidade, que no reino 
contra elle individamente se faziam. 
Estas falsas novidades vinham logo ás orelhas do Infante, que feriam 
sua alma com muita dôr e tristeza, especialmente porque o remedio que 
n'ellas cabia e elle procurava, via que com desprezos lh'o denegavam. 
Na côrte d'El-Rei andava a este tempo um Berredo, proto-notairo, filho 
de Gonçalo Pereira, de Riba de Vizela, mancebo avisado, que por estar 
já em côrte do Santo Padre tinha boa pratica, e por algumas letras que 
aprendera havia solta audacia de dizer. Este por astucia e conselho do 
duque e do conde d'Ourem, veiu á côrte bem avisado d'elles, do que 
secretamente diria a El-Rei para o fim que desejavam, que era meter 
El-Rei em odio com o Infante D. Pedro e tira-lo do regimento, e com 
achaque de despedir suas cousas para Roma, fallava com elle muitas 
vezes em apartado, por cujo malicioso meio e falsa informação que 
astuciosamente dava a El-Rei, se seguiu principalmente o maior damno 
que o Infante e suas cousas receberam. Porque com isto fazia-se grande 
servidor e muito familiar do Infante, a cuja casa, camara e mesa ia 
continuamente. D'onde maliciosamente trazia novidades e suspeitas a 
El-Rei, com que umas horas lhe fazia crêr que andava subgeito, e 
contra o que a seu estado cumpria, e outras que sentia do Infante que 
queria reinar e fazer seus filhos grandes, acautelando-se sempre que o 
que dizia a El-Rei, não era como imigo nem desservidor do Infante, de 
quem recebia honra e mercê; mas porque era portuguez leal a El-Rei a 
quem mais devia. 
E assi o sabia entoar, que todo o que queria imprimia á sua vontade na 
molle e nova edade d'El-Rei, e por aviamento d'este se foi El-Rei vêr 
com o conde d'Ourem a Torres Novas. Onde com muitas razões, que 
para o caso com seus aderentes tinha compilladas, fez crêr a El-Rei 
camanho abatimento e quão grande sobgeição sua era andar mais o 
Infante na côrte, que cedo por isso não obedeceriam    
    
		
	
	
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