A fundação da monarchia portugueza | Page 2

Antonio Vasconcellos
justo e util sem curar de lhe conquistar o affecto. Sei mesmo que terei occasi?es de lhe desagradar.
As minhas opini?es acerca da quest?o iberica s?o conhecidas em Portugal e fóra do reino. N?o s?o de hoje. A occasi?o de as manifestar mais extensamente é que veiu agora sem que eu a procurasse. Pareceu-me que a podia e devia aproveitar em beneficio publico, e assim o fiz, como qualquer outro portuguez o teria feito, escrevendo ácerca da funda??o da monarchia.
A idéa da uni?o de Portugal com Hespanha é antiga, mas sempre nasceu de despeito ou de ambi??o quer dos homens de lá, quer dos de cá. Ora v?o fundar o futuro dos povos sobre duas más paix?es e ver?o que resultados alcan?am!
Os hespanhoes quando est?o poderosos, querem arredondar o territorio, e quando andam mal governados, querem quem os governe bem. Em ambos os casos tem sempre olhado para Portugal com cobi?a. Triste remedio para elles e para nós!
Eu tenho muita affei??o aos hespanhoes. é uma grande na??o. Quero-os para visinhos, para irm?os, para amigos, para alliados, para confrades no trabalho da civilisa??o, para tudo emfim, menos para darem cabo do que tanto nos custou a estabelecer e firmar.
Eu bem sei que se diz que nós ficaremos sendo os senhores, que a c?rte ha de vir para Lisboa, e que até as armas portuguezas ter?o no escudo iberico o melhor logar antes das de Le?o, de Castella e de Granada. Muito obrigado pela honra que nos fazem. Nós somos pequenos para tanto.
A respeito da uni?o de Portugal a Hespanha cada um diz o que lhe occorre á idéa; qual nos designa para sermos victimas de uma organisa??o geral de nacionalidades; qual nos imagina desejosos de pertencer á na??o visinha; este pretende preparar-nos para a annexa??o pelo receio da possibilidade della; aquelle para utilidade propria avisa-nos do perigo que talvez inventou.
Tudo isto póde ser verdade e tambem póde ser mentira. Acreditemos que é verdade; sejamos cada vez mais zelosos da nossa nacionalidade; procedamos de modo que a Europa nos julgue dignos de continuar a ser independentes, e n?o deixemos arreigar a idéa de que a fus?o é inevitavel.
No fim de tudo, dos portuguezes a quem a idéa da uni?o iberica agradou pela grandeza das consequencias que parecia resultarem d'ella, nenhum ha que na hora extrema seja capaz de renegar a patria. Nem dos hespanhoes sensatos haverá muitos que sonhem com a conquista e annexa??o do territorio portuguez contra nossa vontade. A quest?o é pois unicamente theorica.
O resto da Europa pouco se importa das nossas cousas. Olha para o mappa, e resolve o negocio geographicamente. Em vez de dividir o territorio em dois estados iguaes, dando-nos a a metade occidental da peninsula, apaga a historia de sete seculos, e annexa-nos á Hespanha, já se sabe, para nosso bem.
Contra este modo de sentencear devemos nós todos protestar por palavras e obras--verbo et opere.--Por palavras, indicando os dotes de na??o forte e independente, que realmente possuimos; e por obras, dispondo-nos sem precipita??o nem negligencia para sustentar o nosso bom direito.
Possa este modesto livro contribuir para esse fim e ajudar a conservar vivas na lembran?a do povo, as tradi??es da nossa gloria e das nossas virtudes antigas.
Esse é o meu sincero desejo.

A FUNDA??O DA MONARCHIA PORTUGUEZA
..............e venceram: Que pelo rei e patria combatendo Nunca foram vencidos portugueses GARRETT. Romanc.

I
INTRODUC??O
A independencia de Portugal dura ha sete seculos. O bra?o leonez n?o p?de suffoca-la ao nascer, e os arabes tiveram que ceder os territorios do sul á energia dos cavalleiros e pe?es do conde D. Henrique, e ao esfor?o dos primeiros reis da dynastia affonsina.
As fraquezas do formoso rei D. Fernando, os planos da rainha D. Leonor Telles, as ambi??es desleaes de alguns fidalgos e prelados, e as armas de D. Jo?o I de Castella n?o conseguiram sujeitar os portuguezes á domina??o estrangeira. O povo n?o quiz ser castelhano.
Bem lhe andaram a dizer que mais valia ser provincia de uma grande monarchia do que reino independente, mas pequeno e fraco. O povo quiz antes ficar pequeno em sua casa, do que ir ser grande na casa alheia.
Com um mancebo por chefe combateu contra os castelhanos, conteve os naturaes que propendiam para o dominio estrangeiro, e depois de ter vencido as hostes inimigas, poz a cor?a portugueza na cabe?a do mestre de Aviz.
Este principe era bastardo e clerigo. Que importava isso? A na??o adoptou-o por seu filho legitimo; e elle proprio em Aljubarrota, escreveu com a espada nas costas dos castelhanos a sua carta de legitima??o. O papa dispensou nos votos ecclesiasticos, e deu-lhe licen?a para casar. E ficou t?o bom rei como se filho legitimo tivera nascido, e t?o bem casado como se nunca houvera sido clerigo.
Reis, como aquelle, houve poucos. Filhos, como elle teve, raras vezes nascem nos pa?os dos soberanos. Nobre ra?a foi aquella dynastia de Aviz!
Continue reading on your phone by scaning this QR Code

 / 21
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.