ás duas 
senhoras cadeiras para se sentarem e offereceu-lhes um copinho de leite 
fresco e morno. 
D. Julia, a quem o caminho tinha fatigado, aceitou o offerecimento. 
Rosa trouxe então uma toalha de linho, alvo como neve, que estendeu 
sobre uma mesa, na qual collocou o melhor pão, que havia em casa, 
manteiga e um copo de leite. 
D. Julia, com uma alegria infantil, aceitou este lunch frugal, e, 
reanimadas com elle as suas forças, pediu para visitar a quinta. 
A avó de Rosa estava sentada no jardim, debaixo d'um caramanchel de 
clematites, fiando, e cantando com voz tremula o estribilho d'um
romance antigo. N'esta boa velha, bem vestida e de boa presença, 
ninguem seria capaz de reconhecer a pobre cega, que dezoito mezes 
antes, quasi morrendo de fome e frio, e podendo apenas suster-se em pé, 
encontramos seguindo o caminho da serra de Vallongo para S. Cosme. 
A viscondessa do Candal e sua filha saudaram a pobre cega, e esta, 
prevenida pela netinha, correspondeu-lhe respeitosamente. 
--Não vos incommodeis, boa mulher---lhe disse a 
viscondessa--permitti-nos sómente que conversemos por um instante 
convosco. 
--É muita honra para mim, minha querida senhora;--respondeu a 
cega--estou portanto ás vossas ordens. 
--Visto isso não vos recusareis a dizer-me se estaes satisfeita com a 
vossa neta? 
--Se estou contente com a minha Rosinha?!--exclamou a cega---com 
ella, que é a minha benção sobre a terra. Quando o meu genro morreu, 
por causa d'uma ferida, que fez em uma perna com o seu machado, 
porque elle era rachador de lenha na serra, e a quem minha filha, mãi 
de Rosa, seguiu passado pouco tempo, quasi que enlouqueci, porque 
não sabia o que havia de fazer. Rosa, disse-me com a sua voz meiga e 
humilde: avósinha, eu conheço uma senhora muito caritativa; vamos a 
sua casa, que estou certa nos ha-de recolher. E foi verdade. 
A snr.^a D. Thereza, essa boa e caritativa senhora, para quem peço a 
Deus todos os beneficios e bençãos, teve a caridade de recolher em sua 
casa uma velha enferma e inutil como eu. Mas isto devo-o a Rosinha, 
porque ella sabe dizer as cousas de tal maneira, que, penetrando até o 
coração, commovem e decidem á compaixão. Vai em dezoito mezes 
que aqui nos achamos. Fio um pouco para não estar em descanço; mas 
Rosinha, senhora, Rosinha, cantando sempre, trabalha desde pela 
manhã até á noite. Em quanto que dura o verão, occupa-se a colher 
flôres na serra e no campo, e a fazer cestinhos com ellas; mas isto não 
obsta a que, quando se recolhe, lave a roupa, limpe os moveis, e ajude a 
cozinhar, e se quizesse dizer-vos tudo o que ella faz, ou sabe fazer,
levar-me-ia muito tempo. 
Assim, amo muito a minha querida Rosinha. Mas onde estás tu, que te 
não chegas a mim para te dar um abraço? 
Rosa, com o pretexto de ir colher um ramo para D. Julia, tinha-se 
retirado, quando a avó começára a elogial-a. 
A viscondessa e sua filha ouviram com prazer o panegyrico de Rosa, 
feito pela avó, e iam fazer novas perguntas, quando D. Thereza chegou. 
Depois de terminados os comprimentos preliminares, a viscondessa 
expoz a D. Thereza como sua filha sympathisára com Rosa, e estava 
resolvida a tomal-a sob a sua protecção, se D. Thereza a isso se não 
oppozesse. 
--Primeiro que tudo--respondeu D. Thereza--desejo a felicidade e 
venturas de Rosinha, ainda que me ha-de custar muito a separar-me 
d'ella: porém, se fôr sua vontade, não me opponho, por que julgo lhe 
procuraes a sua felicidade; mas ponho por condição, que lhe não 
prohibireis vir algumas vezes visitar-me. 
--Isso, senhora, é um dever sagrado, que Rosa tem a cumprir. Vamos 
porém interrogal-a, por que ella nada sabe do que acabamos de fallar. 
D. Thereza chamou a pequena, que veio correndo, e disse-lhe: 
--Rosinha, queres ir viver com esta senhora e sua filha? 
--Pois vós, senhora--respondeu Rosa tremula e timida--quereis 
mandar-me embora? 
--Não. Pergunto sómente se me queres deixar, para te tornares uma 
menina da cidade, instruida e de maneiras polidas? 
--Não, minha senhora. Nunca--disse Rosa chorando, lançando-se nos 
braços da sua bemfeitora--nunca vos deixarei. Tenho muitos e muitos 
desejos de me instruir e de aprender, mas, se para isso é necessario o 
deixar-vos, antes quero ficar ignorante toda a minha vida.
Recolheste-nos, senhora, quando eu e a minha querida avósinha, 
estavamos quasi a morrer de fome, e havia de ser tão ingrata, que, 
quando principio a servir d'alguma utilidade, vos abandonasse? Não, 
senhora, nunca, nunca vos deixarei. 
--Ouvistel-a, minhas senhoras--disse D. Thereza enxugando os olhos, 
razos de lagrimas. 
--Pelo que vejo, Rosa, estás bem decidida a não vir comnosco?--lhe 
disse a viscondessa. 
--Seria feliz e muito feliz, minha senhora, se podesse ir viver na sua 
companhia, e de sua estimavel filha; mas antes de vós, está a snr.^a D. 
Thereza, que salvou a minha pobre    
    
		
	
	
	Continue reading on your phone by scaning this QR Code
	 	
	
	
	    Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the 
Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.