Um meeting na parvonia | Page 2

Not Available
tem credito bastante
P'ra sair, d'esta crise,
triumphante.»
XVII
«Sou regenerador, eu digo-o ufano;
O bem do povo é sempre o nosso
alvo;
Aborreço o governo que é tyranno.
Dos tributos, pranchadas
sereis salvo;
Quem comigo votar não tema engano.»
Mas n'isto
berra alguem:--«Oh seu papalvo,
Já todos conhecemos vossas manhas:

O povo não engole taes patranhas.»
XVIII
«É falso! não consinto se pretenda
Menoscabar quem tanto se acrisola;

Mormente o bom ministro da fazenda,
Que, macio nos tributos,
não esfola.»
--«Fóra! fóra! seu traste d'encommenda!
Gritou o
povoreo, este é granjola!»
E o sucio, por temer as consequencias,

Escondeu-se nas mudas reticencias.
XIX

--«Eu sou republicano cá de dentro!»
Disse um tal agarrando um
pedregulho.
--Fóra, fóra!--clamaram lá do centro.
Crescera a
vozearia e o barulho:
--«Ah! safa, seu canalha, que o desventro!
Já
se calle, ou a boca lhe atafulho!
Lhe brada, faca em punho um vil
fadista:
Acabemos com a raça realista.»
XX
Tal quando ronca o mar em tempestade,
Revolvido por grande
furacão,
E em montanhas de espuma corre, invade
Ainda a mais
alt'rosa embarcação;
Ou quando no aduar em feridade
De assalto
abrindo as garras o leão
Percorre a empolgar seu inimigo,
Assim o
orador se viu em p'rigo.
XXI
Mas n'essa confusão o paroleiro
Se esgueirava, fugindo com
prudencia;
A mesa assalta um lépido barbeiro,
Que sóbe desde logo
á presidencia.
Muitos gritam:--«Os reis custam dinheiro
Que sae
dos nossos bolsos; é d'urgencia
Acclamarmos da plebe a sob'rania.»

E de vez foi crescendo a gritaria.
XXII
--«A palavra! a palavra, cidadão!»
Todos pedem, mas logo o
presidente
Tocava a campainha, que o tacão
Lhe impede ser ouvido
d'essa gente.
--«Ordem, ordem!... silencio! á votação
Vou propor,
se o club m'o consente,
Artigos do contrato federal,
Que abula a
realeza em Portugal.
XXIII
Que futuro medonho nos aterra!..
Funccionarios, ministros, titulares

Absorvem e devoram nossa terra!
Tropeçamos ahi co'os militares

Sem termos nem sequer sombras de guerra,
E sustentamos, nós, os

populares
Um _deficit_ a crescer, e os publicanos
Tributos a lançar
todos os annos!
XXIV
E caem os partidos, sempre os mesmos
Do governo os mandões, a
mesma escola;
O estado a soffrer graves tenesmos,
Só nos resta o
pedirmos inda esmola;
A fazenda consome-se em torresmos,
E
vâmos n'um recúo-caranguejola;
Somos ricos e grandes de comedia.

A triste bancarota alguem impede-a?
XXV
O supremo poder nas mãos d'um homem,
Que póde ser um tolo, ou
um tyranno!
A historia dos reis, que os tempos somem,
Consultae, e
tereis o desengano.
Providencias energicas se tomem
Contra o
nosso porvir, e o grave damno
Que os despostas causaram a seus
povos;
Meus principios são justos, e são novos.
XXVI
É um rei liberal, como é a pella
Na mão d'um jogador; do ministerio

Espera para a rubríca a chancella
E faz o que lhe dizem, sem
criterio
Se a coisa é de momento ou bagatella;
Pois se quer
governar, sem refrigerio
Dos partidos depostos, soffre assomos,

Qual juiz de arraial co'os seus mordomos;
XXVII
Sempre ás cristas, e sempre engalfinhados,
Cubiçando os poleiros das
nações,
De ministros, de pares, deputados,
De camaras, de
empregos; ambições
Porque morrem de amor e de cuidados,
Não
lh'importam... (que grandes maganões!)
As venturas do povo... em
palavrorios,
Sobem, descem com vivas, foguetorios.
XXVIII

Portugal anda ha muito n'estas crises;
Na terrivel pressão de tantas
mós,
Vae moendo farinha p'ra os felizes
Que contentes lhe
cantam--_Venha a nós_!
Mas se um dia a revolta alçar a voz
Em
delirios cruentos, nos paizes
Onde endémica lavra a _devorite_,
É
p'ra logo applicar-lhe dynamite.»
XXIX
«Cidadão, vou entrar n'esta palestra
E mostrar-vos, que a natureza é
sabia:
O cortiço é communa, a abelha mestra
De governo perfeito a
ideia acaba-a.
Economica, vêde, não sequestra
Com tributos, ardis,
com manha e labia
Do seu povo a uberosa dotação;
Aprendei o que
ha bom n'esta lição.»
XXX
--«Bravo, _sô_ Zé Mathias... é bem dito!
O rei é um chupista... e
apoiado...
Diz elle que é divino... é um maldito,
Que as rendas
dizimando vae do Estado.»
Com palmas um cantava o pirolito,
E
outro com a banza bate o fado.
--«Ordem, ordem! berrava o
presidente;
Assignem o protesto, que é urgente.»
XXXI
«Se em nascimento e morte são iguaes
Os homens, o que importam
distincções?
Porventura tem rei os animaes,
Duques, condes,
marquezes e barões?
Tem ministros, soldados, generaes?
Um
thesouro com praga d'inscripções?
Ha fórma de governo, que reuna

Maiores bens, do que a provida communa!
XXXII
Silencio... Não tem ricos, não tem nobres;
Permitte a cada um o que é
preciso.
Portugal, é mister, que tu recobres
Teus foros sociaes, sem
prejuizo
Dos que nascem... nem haja humildes, pobres;
Sejam

nossos brazões: honra, juizo;
A terra fique livre, os bens communs,

E p'ra todos acabem os jejuns.
XXXIII
Bem nos basta aturar o rei do dia,
Que d'inverno a soslaio nos visita,

E de verão nos abrasa em calmaria.
Todo o rei é verdugo e parasita,

Que as entranhas do povo, qual harpia,
Molesta d'extorsões,
opprime, irrita;
Por este decilitro vos protesto
Que o governo do rei
é o mais funesto.
XXXIV
Vêde desgraça tanta... esses pedintes,
Co'os filhinhos ao collo as
tristes mães,
E nós d'essas lamurias sendo ouvintes
Sem ter para
lhes dar soccorro e pães;
Da miseria chegaram aos requintes
Que os
ossos vão roendo como cães
E os ministros reunem na Ajuda
A
pedir á nação que lhes acuda.
XXXV
Eu vos juro, valentes patriotas
Que buscaes alluir a monarchia,
Que
havemos de enforcar os agiotas
E aos ricos... oh! que grande
montaria.»
--«Muito bem! bravo! viva!» Entre risotas
Festejavam
do povo a sob'rania,
E
Continue reading on your phone by scaning this QR Code

 / 7
Tip: The current page has been bookmarked automatically. If you wish to continue reading later, just open the Dertz Homepage, and click on the 'continue reading' link at the bottom of the page.